terça-feira, 21 de junho de 2005

Manual de Exceção

Na edição de hoje, a Folha de São Paulo está trazendo trechos de uma entrevista que a ministra a Casa Civil concedeu, em 2003, à Luiz Maklouf Carvalho. Evidentemente, salta aos olhos a imensa coragem da jovem Dilma Rousseff ao enfrentar as barbáries perpretadas no subsolo da ditadura militar. E, em meio a este relato dramático - que faz reviver o período mais vergonhoso da nossa história - vêm à tona algumas das técnicas que a moçada, então ligada à guerrilha, utilizava para enfrentar as sessões de tortura. Eis alguns trechos:

"(...) Nos depoimentos, a gente mentia feito doido. Mentia muito, mas muito.(...) A gente tinha que fazer uma moldura e só se lembrar da moldura, da história que se inventava, e não saía disso. Tinha que ter uma história. Na relação do torturador com o torturado a única coisa que não pode acontecer é você falar "não falo". Se você falar "não falo", dali a cinco minutos você pode ser obrigado a falar, porque eles sabem que você tem algo a dizer. Se você falar "não falo", você diz pra eles o seguinte: "Eu sei o que você quer saber e não te direi". Aí você entrega a arma pra ele te torturar e te perguntar. Sua história não pode ser "não falo". Tem que ser uma história e dali para a frente você não sabe mais nada, não pode saber."

Imagino que esta técnica não tenha sido inventada pela dona Dilma mas, ao contrário, faça parte do conjunto de conhecimentos recebidos pela atual chefe da Casa Civil ao longo da sua militância na guerrilha urbana - e ao qual ela, justificadamente, recorreu no momento em que se viu diante de seus algozes.

Logo, eu poderia concluir que há toda uma geração de ex-revolucionários que domina a arte do interrogatório. E, conseqüentemente, poderia me perguntar sobre o quanto esta formação influencia o desempenho desta geração diante dos novos questionadores que ela atraiu para si no momento em que subiu ao poder.

É certo que não vivemos mais um regime de exceção - e nem a imprensa vai aos entrevistados munida de pau-de-arara. Mas também é verdade que, nos últimos tempos, temos vistos ex-combatentes da esquerda revolucionária negarem enfaticamente no café da manhã aquilo que são obrigados a admitir no almoço.

Nenhum comentário: