segunda-feira, 6 de novembro de 2006

De como a condenação de Saddam desmascara o pensamento da esquerda

O julgamento de Saddam Hussein - e sua condenção à morte - é uma ótima oportunidade para testar o cômodo relativismo que permeia a esquerda ocidental. E assim é porque, ao posicionar-se como inimigo dos Estados Unidos, Saddam ganhou, por obra e graça da esquerda, aquela aura mágica que torna digno de perdão todo aquele que se oponha à sempre combatida hegemonia norteamericana - não importando quais tenham sido os seus pecados.

Desde ontem, quando a sentença foi proclamada, começaram a surgir artigos que questionam tanto a formação do tribunal especial que o julgou quanto a pena me si. Com relação ao tribunal, as suspeitas recaem sobre o fato de que o mesmo não poderia ser imparcial, uma vez que foi formado por iraquianos. Já as críticas sobre a pena de morte por enforcamento, vão desde a simples negativa deste tipo de pena até a análise mais fria, que prevê que a execução do ex-ditador irá mitificá-lo mais ainda, potencializando o fanatismo e a violência na região.

É uma argumentação estranha se lembrarmos como outras questões sobre o Oriente Médio são tratadas pela intelectualidade ocidental - esta, sim, sob a tutela hegemônica do pensamento de esquerda.

Peguemos, por exemplo, a opressão e a violência contra a mulher no islamismo radical. Não raro, os tímidos pedidos de intervenção - a maior parte deles, na voz de mulheres que conseguiram se libertar deste sistema perverso - são questionados pelos argumentos do " respeito à diversidade cultural" e do "direito à autonomia dos povos". Na maioria das vezes, a única atitude da intelectualidade ocidental diante deste drama feminino é um silêncio constrangedor.

Logo, cabe perguntar no quê Saddam Hussein é diferente destas mulheres. Ele não cometeu seus crimes no Iraque e contra o povo iraquiano? Então, por que não repeitar "autonomia" dos iraquianos para julgarem seus criminosos? A pena de morte não é uma prática no Iraque? Então, por qual razão não se deve, neste caso, respeitar a "diversidade cultural iraquiana"? Que hipocrisia é essa de aplicar-se um conceito para a violência contra a mulher e outro para um ditador sangüinário?

Já a preocupação de que, uma vez enforcado, Saddam Hussein venha a se tornar um mito, fazendo aumentar a violência na região, é de uma inocência quase pueril. Primeiro, porque a violência lá já se encontra em níveis dificilmente superáveis. Segundo, porque ele já é um mito. Para a intelectualidade de esquerda - leia-se, a maioria da intelectualidade ocidental - Saddam já é um mito de resistência à hegemonia americana, superado apenas por Bin Laden. E esta é a razão única pela qual sua condenação à morte está causando tanta dicussão. Tivesse o sangüinário Augusto Pinochet - que perseguiu, matou torturou esquerdistas - recebido o mesmo tratamento, não haveria qualquer reclamação.

3 comentários:

maroto disse...

CONTROLE DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO E INFORMACÃO COMECA A CAMINHAR PARA OFICIALIZACÃO:

Projeto quer controlar acesso à internet
http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u20908.shtml

E NASCE A DITADURA!!!

EU VIVO DIZENDO...

(N.G.: sim, Maroto...acabo de postar sobre o tema)

Ruy disse...

Hmmm, Nariz. OK, mas há um problema no seu argumento -você considera que exatamente as mesmas pessoas defendem o "direito à autonomia dos povos" no caso da violência contra as mulheres e criticam a pena de morte ao Saddam. E essas duas coisas nem sempre coincidem.

Ademais, pode haver quem ache bobagem essa conversa da "autonomia" (quando serve pra mascarar violações aos direitos humanos, claro) e critique tanto a opressão às mulheres quanto a condenação do Saddam. Certo?

Outra coisa: se o Pinochet fosse condenado à morte, é óbvio que haveria protestos. (Embora dificilmente algum esquerdista os fizesse. :))

Beijos.

(N.G.: isso mesmo, Ruy. Dificilmente algum esquerdista protestaria contra um pena de morte para Pinochet...Como ele são maioria no meio intelectual, os protestos seriam bem minguados.. )

Ruy disse...

Mas o mundo não é o "meio intelectual", né, Nariz? (Considerando boa parte dos ditos intelectuais, é o caso de dizer "graças a Deus".)

E, embora talvez não seja necessário, deixo aqui "for the record": não tenho pena nenhuma do Saddam, como não teria de Pinochet ou Fidel.

Beijos.