quarta-feira, 13 de junho de 2007

Sela e buçal

Este post foi publicado em 26 de fevereiro último. Está sendo reeditado agora porque traz a minha opinião a respeito do voto em lista. Também provoca uma pergunta: a convocação de plebiscitos e referendos pela sociedade, sem a mediação do Legislativo, que fazia parte da proposta original apresentada pela OAB a Chináglia, foi mantida? É preciso que fiquemos alertas. Quando um petista resolve votar qualquer coisa - mas especialmente uma reforma polítca - às pressas, num momento em que a imprensa está ocupada com a cobertura de tantas denúncias, eu desconfio. Tenho razões para isso. Principalmente porque, às vezes, nossos parlamentares votam sem ler.

Amanhã a OAB e o Planalto se reunem para tentar fechar a proposta de reforma política que Arlindo Chinaglia prometeu, na última sexta-feira, colocar em pauta. Se Chinaglia cumprir a promessa, o projeto deverá chegar ao Legislativo em algumas semanas - tempo hábil para que seja apreciado por todos os partidos.

A OAB não gostou do tom do presidente da Câmara, que deixou claro que as propostas da entidade eram meras sugestões. Mas esfregou as mãozinhas de satisfação ao ver que a discussão está prestes a se tornar realidade.

Já eu não gostei foi do tilintar de sela e buçal que ouço sempre que alguém falar em "voto em lista". Juntamente com fidelidade partidária e o financiamento público de campanhas, o voto em lista integra aquilo que o governo tem como tripé fundamental da reforma.

Paradoxalmente, o pacote da OAB traz, também, a tal proposta para a convocação de plebiscitos e referendos pela sociedade, sem a mediação do Legislativo. Confuso, não? Por um lado, a sociedade brasileira já estaria suficientemente madura para decidir diretamente a respeito de determinados temas. Por outro, não tem discernimento para decidir diretamente sobre quem merece ou não seu voto - no que precisa ser tutelada pelos partidos. Me parece que estão é a nos oferecer espelhinhos e contas de vidro: "divirtam-se aí decidindo sobre a eutanásia, enquanto nós decidimos o orçamento da saúde".

O voto em lista, como vocês devem saber, é aquele subterfúgio através do qual os partidos escolhem quais políticos gostariam de ver eleitos - e o eleitor se limita a votar na legenda. Quer dizer, lá pelas tantas, quem simpatiza com o programa do PSDB pode se ver obrigado a engolir um Eduardo Azeredo, simplesmente porque o partido resolveu que ele deve encabeçar a lista dos candidatos à Câmara Federal - e que a maioria dos votos da legenda serão direcionados para ele. Vale o mesmo para o PFL e Roberto Brant. Já o PT dispensa exemplos. Primeiro porque a lista ficaria longa demais para um só post. Segundo, porque os petistas já têm o hábito de acatar qualquer coisa que o partido lhes enfie goela a baixo - de modo que o governo está apenas querendo estender a todo o quadro político nacional aquela burra procuração em branco que a militância costuma passar ao PT.

Há coisa de três anos, quando a proposta do voto em lista começou a ser mais dicutida por conta da apresentação de um projeto de lei da lavra de Ronaldo Caiado, Miro Teixeira alertava para o fato de que a disputa pela presença ou não em listas futuras coagiria os deputados a serem sempre fiéis às decisões de seus partidos - e, o principal, observava que o impeachment de Fernando Collor não teria ocorrido em tal conjuntura.

E é exatamente este o perigo. Se, por um lado, é verdade que o modelo atual, por ser personalista, enfraquece a importância dos programas partidários no processo de decisão do eleitor, também é verdade que, com o voto em lista, os deputados ficam mais desobrigados (ainda!) de prestar contas à população. Esta é a queixa corrente na Argentina e na Espanha - para citar dois países que usam o sistema. O referencial dos deputados passa a ser somente o partido - o único que lhes pode garantir presença na lista da eleição seguinte. Não é difícil concluir, pois, que no Brasil a corrupção apenas passará a se dar nas entranhas - sempre bem protegidas dos olhos e ouvidos populares - partidárias. Alguém aí se arrisca a imaginar a que peso será negociado o primeiro lugar da lista?

Finalmente, se nenhum destes argumentos lhe parecerem suficientemente fortes, lembre-se que o voto direto é um direito constitucional, prestes a ser derrubado porque gente como Zé Dirceu, que quer dar aos partidos - estas instâncias tão probas da nossa representação política - o direito de limitar nossas escolhas. É a sela que vem, tilintando, na nossa direção. Logo, logo eles vão querer montar.

3 comentários:

Marcos Matamoros disse...

Se aprovarem o voto em lista fechada, eu já decidi: vou anular o voto para deputado em todas as eleições. Se não me deixam decidir em quem votar, eu decido não votar em ninguém
Um beijo,
Marcos

Adalberto Braga disse...

O melhor sistema, contanto que a lista seja composta por candidatos escolhidos em votação por todos os filiados do partido e não apenas por membros dos diretórios ou lideranças.

Carl Amorim disse...

O atual sistema pode ter todos os defeitos, mas permite uma renovação de metade de um congresso corrupto.

Claro que esta renovação nem sempre é para melhor, mas prefiro correr o risco do que ver a volta das oligarquias políticas, que no comando dos partidos, jamais permnitirão que desconhecidos cheguem à posições de destaque.

Lembrem-se que se dependesse de listas o famigerado Orestes Quércia seria cabeça de chapa, com direito a cadeira cativa nos bancos do legislativo e espaço reservado nas tetas do erário.

Pelo voto popular, duvido que seja síndico de seu condomínio.