domingo, 15 de abril de 2007

Que avance a democracia

A preocupação com a educação - em especial, a educação política do eleitorado - é irmã gêmea do sufrágio universal. De Montesquieu a Tocqueville, não houve teórico da democracia moderna que pregasse uma coisa sem a outra.

Mas como o sistema democrático tende a avançar primordialmente pela inclusão cada vez mais ampla de participantes - e somente depois pela implantação dos meios de aperfeiçoamento do sistema em si - chegamos a um ponto em que tornam-se evidentes as conseqüências do direito ao voto do analfabeto, garantido a partir da Constituição de 1988: segundo dados do TSE, dos 126 milhões de eleitores aptos a votar em outubro de 2007, cerca de 24% eram analfabetos ou sabiam apenas ler e escrever. O índice sobe para 68% se forem computados os que não tinham o 1º grau completo e para 74% se considerarmos os chamados analfabetos funcionais - aqueles que não têm a menor noção do funcionamento dos mecanismos políticos.

Conclui-se, pois, que os destinos do Brasil estão sendo decididos por uma maioria de ignorantes políticos. Talvez eles o estejam fazendo mediante aquela "capacidade natural" defendida por Montesquieu. Inegável, porém, que o número de candidatos envolvidos em corrupção eleitos ou reeleitos no último pleito nos faz especular sobre a real existência desta faculdade - ou, no mínimo, da existência daquele um ambiente de informação, debate e conhecimento público, que o teórico francês defendeu como pré-requisito indispensável à democracia.

Uma vez que o sufrágio universal, com base nas novas tecnologias e nos novos meios de comunicação de massa, tenha aberto mão da alfabetização como condição para o exercício da democracia, é praticamente impossível cogitar um retrocesso. No Brasil, em especial, o desleixo governamental para com a educação pública - principalmente aquela do ensino fundamental e médio - colocou-nos numa situação tal que é igualmente inviável pensar numa mudança de quadro para os próximos trinta anos. Com muito empenho e sorte, uma política educacional séria levaria pelos menos duas décadas e meia para reflertir-se nas urnas. E bem sabemos quão longe estamos desta possibilidade.


Se não é possível uma mudança radical e rápida no quadro educacional, talvez a solução seja fazer avançar mais uma vez a democracia.

Comecemos encarando corajosamente uma primeira verdade: boa parte destes 68% de analfabetos funcionais não compareceria às urnas se não fosse obrigada a tanto. Acabar com o voto obrigatório seria, portando, uma forma rápida de resolver parte da questão: afastar das urnas todos aqueles que - a analfabetos funcionais ou não -não se interessem por política.

O risco é que a saída venha a gerar mais alienação e exclusão social. Nos Estados Unidos, determinados segmentos sociais abrem mão, de forma cada vez mais progressiva, do exercício democrático máximo. Na outra ponta, os políticos passam a privilegiar com projetos e iniciativas somente aqueles que comparecem às urnas. Não é, claro, o que queremos. Nosso desejo democrático, já dissemos, vai sempre no sentido da inclusão.

Novamente, a solução pode estar em fazer avançar mais ainda a democracia e romper, numa só tacada, com Montesquieu, Tocqueville e Thomas Jefferson: além de acabar com o voto obrigatório, deveria-se acabar também com a inelegibilidade dos analfabetos. Por um lado, mediante o convite à representação política, se estaria neutralizando a força excludente do voto facultativo. Uma vez convocados a participar efetivamente da política, agora não mais como massa passiva, os analfabetos - sejam eles totais ou funcionais - teriam um estímulo a mais para se interessarem por política. Por outro lado, estaríamos fazendo jus a uma realidade democrática posta: se essa gente pode opinar, deve poder participar ativamente do processo.

Radical, a medida exigiria alguma adaptação: caberia às assessorias dos parlamentares analfabetos, por exemplo, a leitura e a redação dos textos. Mas não se pode afirmar, só por isso, que os resultados seriam mais desastrosos do que já o são atualmente - tome-se como exemplo votação recente, na qual os acusados de crime hediondo ganharam, por distração dos nosso parlamentares, o direito a liberdade provisória e se verá que não há motivos para temer o ingresso de parlamentares analfabetos no quadro político nacional.

4 comentários:

Meus_Sais disse...

Zoião verde, este artigo vai deixar os políticos de cabelo em pé. ré,ré,ré.

Aluizio Amorim disse...

Grande artigo, Nariz. Tem que publicar em algum jornal. Abs do Aluízio Amorim

Marcos V disse...

NG

Também concordo com o voto facultativo.
Votar é um direito.
Paralementar analfabeto fica mais difícil. O que você diz tem lógica até mas...

O Editor! disse...

NG,

Realmente acho que os nossos Paralamentarmos devem ser escolhidos pelo povo na forma de identificação. Votamos em quem defende nossas idéias e em quem pensa como pensamos. Todavia isso não pode ser levado até o limite, pois sabemos que qualquer coisa em excesso é nociva.

Então o que temos que fazer é aumentar o grau de exigência para que as pessoas entrem na política, e não diminuir. É bizarro pensar que por termos parlamentares analfabetos (que supostamente defenderão os direitos de outros analfabetos), o povo será melhor representado. Não será! Quantos político profissionais temos por aí que simplesmente querem continuar na política para ter foro privilegiado e para ganhar um salário de parlamentar (que para muitos políticos nada ou quase nada significa)? Então imagine que você dê o mesmo salário para quem o considere uma fortuna! Alguém sem instrução, que chamará (por medo, respeito ou ambos) a todos de "doutô" e que abaixará a cabeça para as velhas raposas da política... Como isso pode melhorar a representatividade popular?

A forma de melhorar é sempre a mesma, seja com relação à população, aos políticos, aos policiais, aos professores: Educação. Gente inteligente, culta, estudada, que tenha uma boa formação. É esse tipo de gente que melhorará o Congresso.

Simplesmente a exigência de uma formação superior para aqueles que elaborarão as leis e ditarão os caminhos do país (assim como para os cargos do Executivo), faria com que, a título apenas de exemplo, não tivéssemos o desprazer de ver pupular em nossa política, pessoas como Lula, Severino Cavalcanti, Luciana Genro, Paulinho da Força, Vadão Gomes, etc.

Qualquer país que se preza deseja ser liderado e comandado por sua elite. Não necessariamente a elite financeira, mas sim pela elite intelectual do país. Se indicamos um analfabeto para o poder, qual será o interesse dele em se alfabetizar? Qual vai ser a intenção dele em investir em educação? Qual é a mensagem que ele está passando para a população, senão que estudar é besteira e qualquer um pode chegar a chefiar o Parlamento ou mesmo o País sem precisar nem saber ler?

Todas as empresas buscam os melhores para preencher seus quadros, e o melhor dentre esses para comandar a empresa. O exército seleciona, dentre os recrutas, os melhores para que façam um curso e se tornem oficiais, para comandar os demais. Porque seria diferente com o Poder Público? Não deve ser diferente!

Democracia é o regime onde a maioria decide o que será feito, através de um voto que é dado a uma elite (os políticos), para que esses comandem o País.

Porque exigimos até o ensino médio completo para nossos garis, se para ser presidente não precisa de estudo nenhum, ou para ser parlamentar você pode até ser um analfabeto funcional?

Onde está o erro nisso? Em exigir do garí no mínimo o ensino médio completo, ou não exigir dos políticos grau (no mínimo) semelhante?

Beijos,

O Editor!