sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Zero em maternidade

Em Palmeira das Missões (RS), Elaine Martins Schwantz, portando um 38, invadiu o Colégio Estadual Três Mártires e ameaçou matar os professores. O motivo: indignação e revolta porque sua filha foi reprovada em três matérias no terceiro ano do ensino médio. Aqui.

Ao contrário do que vocês possam ser levados a pensar, Elaine não é uma exceção. Conversem com os professores, principalmente com os de escolas particulares, e descobrirão que a única diferença entre Elaine e a maioria dos pais da atualidade é que ela pode ir presa pelo que fez - ao passo que os outros pais dificilmente serão responsabilizados pelos danos que causam aos seus filhos e à sociedade.

Sou do tempo - e creio que a maioria que me lê também é - em que notas baixas no boletim eram motivo para um castigo. As penas eram duríssimas: de uma semana sem ir brincar na rua a uma mês inteiro sem matinê, elas variavam de acordo com a nota e os danos que a mesma poderia causar no aproveitamento escolar anual. Sem contar a vergonha a que éramos submetidos nos churrascos e reuniões familiares, quando todos nos olhavam com reprovação. Um tio meu, aliás, tinha uma técnica infalível. Sempre que algum moleque - os meninos eram piores - aparecia com notas baixas, ele vinha com um discurso semelhante: "Fulano, não se preocupe. Nós te amamos assim mesmo. Entendemos que você é limitado e jamais vamos lhe deixar desamparado. O tio está guardando um dinheirinho para lhe comprar um taxi. Esteja certo de que comida não vai lhe faltar" , etc e tal. Era tiro e queda.

São práticas educacionais familiares de um tempo que já morreu. Hoje, quando a criança apresenta notas insatisfatórias, os pais vão à escola para xingar os professores. As reuniões não ocorrem mais para discutir o comportamento da meninada em sala de aula - e para orientar os pais sobre o que eles devem cobrar de seus filhos. São, isto sim, verdadeiras sessões de linchamento dos professores. Nenhuma ou pouca responsabilidade se exige dos estudantes.

Não é difícil perceber como se chegou a isso. Nos últimos 30 anos, a introdução de novos conceitos pedagógicos acabou por questionar valores antes tidos como certos: a nota como parâmetro de produção, a exigência de um bom rendimento, a valorização da competitividade e o respeito a autoridade do professor caíram por terra. Em substituição, vieram a subjetividade do conceito, o respeito à diferença de ritmo de cada aluno e a exagerada valorização de "saberes" outros, não adquiridos nos livros - aquela história de que saber tocar pandeiro é tão importante quanto saber somar. E se hoje os professores são responsabilizados por tudo é porque houve um momento em que eles se mostraram absolutamente coniventes com estas inovações pedagógicas.

O resultado desta aventura se faz sentir há algum tempo: crianças que aprendem o que querem, quando querem e como querem - e que chegam aos bancos universitários semi-alfabetizadas; professores impotentes e pais que, embora não cheguem às vias de fato, pensam exatamente como Elaine Martins Schwantz.

13 comentários:

Marcos disse...

Algum tempo atrás, um colega professor disse-me uma frase que não esqueci: a escola de hoje é apenas um negócio. Ela quer vender um diploma, que se fosse pago no ato seria muito caro. A família paga em 12 anos, e o filho freqüenta a escola neste período para justificar o negócio. O professor é apenas o cara que está lá para atrapalhar o negócio.

E você está certa, eles próprios defendem toda esta inovação dos 30 anos. O sucesso está demonstrado em qualquer comparação internacional que se faça.

Romualdo Carvalho da Silva disse...

Muito Bom.

Marco Sena disse...

Prezada NG,
De fato, o que se poderia esperar quando o maior nome da educação brasileira (que aliás, dá nome ao Centro Acadêmico da Faculdade de Educação da USP) é o Sr. Paulo Freire? Sem o desmascaramento desses vigaristas intelectuais não consigo ver nenhuma luz no fim do túnel.
Um grande abraço, parabéns pelos textos e um ótimo 2008.
Marco.

Kika Albuquerque disse...

Nariz,

Sou um pouco mais velha que você. E sou do tempo em que "tia" era ou irmã do pai, ou irmã da mãe.
Professora era a PROFESSORA.
Continuo achando que depois que professora virou "tia" e aluno virou "cliente".... danou-se tudo.
Abandonei as salas de aula quando vi que estávamos reduzidas a burrinhos de presépio: balançar a cabeça afirmativamente era tudo a que teríamos direito dali para a frente.
Crianças não podem mais perder horário de recreio, crianças não podem mais levar lições extras para casa, crianças não podem mais ouvir aquela palavrinha mágica e absolutamente indispensável: o "não".
Minha decisão de largar o magistério aconteceu exatamente no dia em que fui chamada à "Orientação Pedagógica" para levar um pito.
Meu pecado? Cobrei a TABUADA!!!!!!
Sabe quem reclamou? A "babá" de um aluno (10 anos!!!!!!!). E a mãe? Sei lá! Jamais a conheci!

Peregrino disse...

NG,

Isso é resultado de que eu chamo de PEDAGOGIA DO PRAZER. Isso me fez lembrar da AULA MAGNA de uma DIRETORA PEDAGÓGICA de uma faculdade particular em Brasília, na qual a seguinte ASNICE foi pronunciada: "Não entendo porque ensinamos logarítmos aos nossos alunos, se eles não precisam disso para viver!". Como diria o Professor Raimundo, aquele da Escolhinha: "E o salário, ó!"

jc disse...

Concordo. Uma vergonha. Falta surra nessa gurizada. Voce deve gostar de ouvir o Prates no jornal do almoço, alias, unico momento desse jornal vagabundo que vale a pena.

Porta Torta disse...

Cara NG:
Parece que a dedicada mãe estava inconformada com os professores das 3 matérias nas quais a sua filha "levou bomba" porque tal fato impediria a dita cuja de cursar a faculdade de Psicologia, onde lograra êxito no vestibular. Das três, uma (confiando na avaliação negativa dos professores do ensino médio estar correta): ou a moça é uma "gênia" apenas nos vestibulares, ou esse vestibular deixa bastante a desejar, ou a aluna é mesmo uma semi-analfabeta e não houve nenhum vestibular mas doação de vaga de faculdade no modelo educacional "entre direto agora, estude (?!?)em nossos melhores cursos e deixe para o governo ao melhor estilo Pró-Uni a conta de seu semi-analfabetismo..."

Bira disse...

Uma mãe que simplesmente não acompanha a vida escolar da filha, ainda quer culpar a escola ou pressiona-la a empurrar via conselho?.

STAR disse...

Nariz estou com asco de 2007, agora só quero sonhar com um 2008 muito diferente, com políticos capazes e honestos, com professores preocupados em ensinar, com pais responsáveis, com um país decente, por enquanto é só sonho, mas de tanto querer e lutar por algo a gente acaba fazendo.

Feliz 2008 com muito amor, saúde, paz e dinheiro para realizar todos os seus sonhos.

Beijo

Harlock disse...

Salve... uma coisa é certa, na elaboração e implantação dos tais "novos conceitos pedagtógicos" os professores de verdade, os que viviam a realidade das salas de aula, esses não foram "ouvidos nem cheirados". Burocratas da educação comodamente instalados em Brasília&alhures, pedagogos compometidos com o "outro mundo possível", sindicalistas "na luta"... esses gestaram e pariram essa coisa que é o "ensino público, universal, gratuíto e de qualidade" nacional.
O problema maior da educação no Brasil não é de base, mas de cúpula.

Marlon disse...

O problema é quando se é recém-formado, não concorda com essas baboseiras pedagógicas de Paulos Freires da vida e se cai, sem mais nem menos, em um ambiente assim.

Aí quando o professor, por mais que tenha conteúdo e não consegue dar aulas para uma sexta série que não fica quieto, o problema cai todo nele, e não na criança que no fundo trata os professores da mesma maneira que tratam os pais em casa.

Outro problema é que esse pessoal acha é que temos que levar a disciplina a vivência dos alunos, entender a realidade, de que nada adianta (sou professor de história e geografia) ensinar sobre a hidrografia, o relevo ou a pré-história. O que tem que se fazer é ensinar a tal " cidadania" , formar um sujeito crítico, e demais clichês que nos enjoam quando lemos alguma obra de educação. Sujeitos críticos que saem de uma oitava série sem ler, mas com a auto-estima lá em cima, pois não podemos fazer nenhuma crítica ao seu desempenho, porque pode traumatizar e excluir a criança do espaço escolar.

F. Arranhaponte disse...

Muito bom. Minhas duas gêmeas de nove anos sabem que eu fico bravo com nota ruim. Não chego a castigar (ainda), mas os sinais são claros. Quando elas me dizem que uma prova foi muito fácil, eu digo que vou reclamar com o professor. Abraço e ótimo 2008 para você

Henrique Cintra disse...

O comentário vai ficar um pouco longo e desde já eu peço desculpas.
A senhora (ou senhorita, eu não sei) está enganda. Em primeiro lugar, é ingênuo acreditar que "vieram a subjetividade do conceito, o respeito à diferença de ritmo de cada aluno e a exagerada valorização de 'saberes' outros, não adquiridos nos livros - aquela história de que saber tocar pandeiro é tão importante quanto saber somar". Se assim fosse, a garota não teria sido reprovada, teria? Além do quê, exceto por alguma escolas de "vanguarda" que possa haver por aí, é evidente que matérias são dadas, provas aplicadas, notas atribuídas, alunos são aprovados ou reprovados. Poucas coisas são mais "objetivas" que as notas na pauta e, na maior parte das escolas, elas são, sim, vistas como parâmetro de produção. Certamente, há anomalias (empurradas pelo governo) como aprovação automática, mas a lógica das notas continua igual (especialmente na rede particular). Que eu saiba, ninguém deixa de ser reprovado em matemática por saber tocar "pandeiro". Não me lembro de alguém ter me perguntado sobre os "meus "outros saberes", talvez até devessem! Quanto a respeitar o ritmo dos alunos, salvo engano, provas são marcadas pela escola, não pelos "pobres" alunos. Sinceramente, não sei se a disciplina, o empenho e o aprendizado são hoje melhores ou piores que em tempos idos, mas sei que os problemas que existem não serão resolvidos através de demagogia barata e de abordagens simplistas. Em segundo lugar,com respeito a quem acha que hidrografia é uma assunto importante, talvez devesse perguntar a seus pares adultos- e membros produtivos da sociedade-de que eles se lembram no que toca aos afluentes do Amazonas. Talvez assim, o professor deixe de olhar para o próprio umbigo tempo suficiente para ter uma visão de conjunto e cumprir melhor seus deveres para com a Sociedade. Talvez, os pais atuais sejam negligentes e seus filhos, vadios, mas isso não justifica erigir fantasias e perder de vista a vida real e tentar combater problemas que não temos em vez de enfrentar os que realmente temos.